domingo, 13 de novembro de 2011

A saga por uma camisa...

Em agosto último passei três semanas em Porto Velho (RO) realizando uma pesquisa. Como faço em toda viagem procurei a camisa de um time local para dar de presente ao meu filho. Pois bem, essa é a descrição da saga vivida por mim para adquirir a dita camisa.

Desde que cheguei a Porto Velho procurei obter informações sobre onde comprar a camisa de algum time local. Perguntei a motoristas de taxi, amigos e transeuntes. A resposta era sempre a mesma: é difícil.

Faltando dois dias para a minha partida resolvi percorrer o comércio local. Parava as pessoas nas ruas e indagava: sabe onde compro a camisa de um time aqui de Rondônia? Talvez lá na Sete de Setembro, disse um morador depois de várias tentativas. Fui apressado ao local. Tive duas surpresas na loja indicada. A primeira é que encontrei o objeto que tanto procurava. E cá pra nós a camisa era muito bonita. Era de um time do interior que infelizmente não lembro o nome neste momento. A segunda é que a mesma custava a "bagatela" de R$ 150,00. Meu espanto foi tão grande que deixei o vendedor um tanto quanto sem jeito:

- Sabe como é, tentou justificar o funcionário da loja, os times locais vendem camisas apenas durante o campeonato. Depois que o mesmo termina as camisas são produzidas somente no ano seguinte.

- Tudo bem, lhe disse, mas com esse preço eu compro uma camisa oficial do Barcelona, o melhor time do mundo.

Diante desse poderoso argumento, o vendedor contra-atacou:

- Certo, vamos fazer o seguinte, se o senhor pagar à vista nós lhe daremos um desconto e ela custará R$ 120,00.

Eu não sei se ria com a situação, se reclamava ou se pagava e ia embora. Resolvi ir embora.

Lá estava eu mais uma vez nas ruas de Porto Velho procurando uma camisa de time local para dar ao meu filho. Pergunta daqui, pergunta dali e lá pelas tantas alguém disse:

- Vá lá na sede do Ferroviário, eles têm camisas para vender.

Peguei informações sobre onde ficava tal sede e me dirigi para lá. Uma sede razoavelmente estruturada, diga-se. Contei mais uma vez toda a saga que estava vivendo. Contudo, nada de camisas. O desânimo começou a tomar conta de mim. Foi aí que um sócio do clube reacendeu minhas esperanças:

- Lá na Federação de Futebol eles vendem camisas, afirmou.

Com passos acelerados voltei às ruas da capital rondoniense.

Agosto é um dos meses do ano em que há "um sol" para cada pessoa em Rondônia. O calor era grande. Meus pés pareciam estar sendo cozidos dentro dos sapatos. O suor tomava conta de mim. A camisa grudada no corpo e aquele odor nada agradável exigiam um banho o mais rápido possível. A umidade estava baixíssima, ao redor de 20% em determinados dias. A fumaça das queimadas invadia a cidade, deixando tudo ainda mais complicado. Era difícil respirar, principalmente à noite.

Na sede da Federação conheci um dos assessores de comunicação da entidade. Falei-lhe da minha batalha épica para agradar o filho e pedi-lhe ajuda.

- Bem, aqui nós não temos camisas à venda, disse ele.

Ainda reclamou da falta de profissionalismo dos times locais e do pouco apoio das empresas ao futebol rondoniense. Pegou o celular e passou alguns números de presidentes de times para que eu perguntasse a eles sobre a venda de camisas. Foi o que fiz. Liguei uma, duas, três vezes. A resposta era a mesma: "não temos mais camisas, só ano que vem". Foi aí que o assessor lembrou de um time novo da capital que, segundo ele, mostrava o profissionalismo que faltava aos demais. O time: Santos de Porto Velho.

O Santos de Porto Velho é na verdade uma escolinha de futebol que mantém parceria com o famoso Santos de Pelé. Liguei para o clube e.....

- Sim, temos camisas para vender, disse a funcionária.

Peguei um moto-taxi e atravessei a cidade. Já era final de tarde. A escola está localizada às margens de uma importante avenida de Porto Velho. Até onde pude observar a estrutura parecia ser boa. Havia muitas crianças no local. E o time principal se constituiu em pouco tempo numa das forças futebolísticas de Rondônia, fazendo bonito no estadual. Quanto custa a camisa, perguntei. A resposta: R$ 60,00. O que há de se fazer? Os pais fazem de tudo para agradar os filhos....

Se alguém pensa que isso é coisa de Rondônia está completamente enganado. Ao final de 2010 a galera daqui de casa estava em São Luis. E também não foi nada fácil comprar a camisa de um time local. Já os uniformes do Flamengo, Corinthians e outros grandes clubes do Brasil e do exterior são vendidos em diversos pontos da cidade. Para achar uma camisa do Nacional de Manaus tive que peregrinar por muitas lojas daquela cidade. Adquiri o único exemplar disponível numa loja de materiais esportivos. Essa é a dura realidade da maioria dos clubes brasileiros. Sem apoio de empresas, dos governos e das próprias torcidas os clubes definham lentamente, restando torcer por clubes de outras regiões do país ou da Europa.

Pelo menos aqui no Pará é situação é um pouco melhor. Não é nada difícil adquirir uma camisa do São Raimundo, em Santarém. O mesmo não se pode falar da do São Francisco. Em Belém, por onde você olha há torcedores do Remo e do Paysandu desfilando orgulhosos com seus "mantos sagrados" pelas ruas da cidade. Porém, a falta de profissionalismo, o desleixo e a corrupção se fazem presente nos clubes. Se não fizermos nada para reverter a atual situação do futebol paraense poderemos enfrentar no futuro a mesma saga que hoje se vivencia em Porto Velho, Manaus e São Luis.

Mesmo sem divisão: LEÃO, nós te amamos!!!

sábado, 5 de novembro de 2011

Belém e a imundice

Nasci e me criei em Belém. Por apenas dois anos e meio estive fora da cidade, período em que residi em Manaus. Tenho dificuldades para me ver ver vivendo em outro lugar. Nossa cidade é encantadora. Amigos que vêm por essas bandas se maravilham com a hospitalidade das pessoas, as comidas típicas, as vendedoras do Ver o Peso, a variedade de sabores dos sorvetes, o Teatro da Paz e por aí vai. Ouvir falar bem da nossa cidade é sempre muito bom ao nosso ego.


Entretanto, não podemos fechar os olhos a uma triste realidade: nossa Belém é imunda. O lixo está "democraticamente" espalhado na periferia e no centro da cidade. A outrora metrópole da Amazônia parece ter sucumbido ao lixo. É lixo nos ônibus, nos quintais, nas frentes das casas e dos prédios, nas calçadas, nas praias, nos rios que circundam a cidade e nos igarapés que a recortam. Desde as bitucas de cigarro até móveis, colchões etc. E não se pode dizer que isso ocorre por "mal hábito dos pobres", como alguns preconceituosos brandam sem cessar. É ou não comum vermos pitboys em seus carros importados lançando latas e mais latas de cervejas pelas ruas da cidade? Veja a Doca, por exemplo. Todos têm culpa independentemente da renda. Contudo, não se pode desconhecer que para quem mora na periferia, lugares em que muitas vezes o carro do lixo sequer entra, a situação é bem mais complicada. Então temos um misto de incompetência governamental e de pouca noção de cidadania, que juntas transformam nossa cidade nesse lixão a céu aberto.

Um "pequeno" detalhe. Os governos tucanos se vangloriam de terem realizado a Macrodrenagem da Bacia do Una. A maior obra de infraestrutura urbana da América latina, dizem eles. Enchem o peito emplumado para afirmar que gastaram cerca de R$ 700 milhões na obra. A maior parte emprestada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento e com recursos do governo federal. Pois bem, eu lhes pergunto: Onde estão as estações de tratamento? Gastaram uma fortuna na dragagem, na instalação de fossas sépticas e na ampliação das redes de esgoto e de água e absolutamente nada na construção dessas estações? Os igarapés se tornaram grandes valões onde toda espécie de imundice se movimenta de um lado para outro. Peço desculpas aos lasanheiros e lasanheiras, mas para mim isto é uma junção de burrice, mal caratismo e - vamos dizer - mal uso do dinheiro público. Numa linguagem chula podemos afirmar o seguinte: a bosta captada de nossas casas está sendo jogada tal como antes do Projeto de Macrodrenagem nos rios onde captamos água para beber. E essa é a loucura da história, porque o tratamento fica ainda mais caro. Coitado do nosso dinheirinho...

Voltemos ao lixo - desculpem, não resisti. O nosso "honesto" e "competente" prefeito Duciomar Costa está movendo mundos e fundos para garantir a privatização do tratamento do lixo na Estação do Aurá. Primeiro, porque isso lhe garantirá muitos fundos
- principalmente nas futuras campanhas eleitorais, inclusive a do ano que vem. Segundo, com esses fundos ele vai viver no melhor dos mundos. Basta ver a singela evolução patrimonial do ilustre edil, de seus familiares e alguns amigos do peito (haja peito) nos últimos sete anos em que Dudu esteve a frente da prefeitura de Belém.

Os projetos sociais que havia no Aurá foram desmontados por Duciomar Costa. Justamente projetos de largo alcance que fizeram Belém receber vários prêmios da UNICEF e de outras instituições. Crianças foram retiradas do local por conta de serem atendidas pelo Bolsa Escola e houve o desenvolvimento de um trabalho interessante junto aos pais. Infelizmente tudo foi jogado no lixo.

A coleta do lixo já é algo ineficiente e foi privatizada há tempos. Agora, Dudu nos diz que com a privatização do Aurá tudo vai melhorar. Vai mesmo? Dudu é um privatista. Fez de tudo para tirar da COSANPA a atribuição de prestar os serviços de abastecimento de água e de coleta e de tratamento do esgoto. Para buscar a universalização dos serviços e assim melhorar as condições de vida de todos os habitantes de Belém? Não! Para repassá-los a grandes grupos privados. E se alguém acha que isso seria o melhor para a nossa cidade, pergunte a quem mora em Manaus se está plenamente satisfeito com a multinacional francesa que hoje é responsável por essa atividade na capital amazonense.

A coletiva seletiva de lixo em Belém é uma piada. Simplesmente não existe. O que vemos são ações pontuais. Até uma grande rede de supermercados da cidade iniciou a sua própria coleta seletiva. Enquanto isso, na Sala da Justiça, Dudu força o seu poderoso cérebro pra encontrar mais uma coisa para vender...

Brincadeiras a parte é preciso dizer que sinto vergonha de ver a situação a que chegamos. Eu que viajo bastante fico um tanto quanto abatido a cada volta. De constatar que a noção de cidadania ainda é algo distante na nossa comunidade e que o mal caratismo e a corrupção dão as cartas em altas esferas do poder local. Nos resta cantar?

Joga fora no lixo, joga fora no lixo...

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Tempos sombrios... E de alguma esperança!

Sou um leitor ávido. Sempre fui. Ao mesmo tempo busco acompanhar os acontecimentos imediatamente próximos de mim, como também aqueles que ocorrem em paragens distantes. E devo confessar a vocês que ando vivenciando um misto de sensações, nem sempre boas.

Desde o ano passado o mundo árabe vem sendo sacudido por levantes populares contra as tiranias, as más condições de vida, por democracia e liberdade. Isto em si mesmo é um fato da mais alta relevância, porque se, de um lado, esses movimentos se levantaram contra todas as formas de opressão; de outro, não significaram a adesão automática ao extremismo que tentou ganhar maior espaço político nessas sociedades. Porém, não há como desconhecer também o papel nefasto que as grandes potências mundiais, em particular o Tio Sam e a União Europeia, vem desempenhando nessa região por conta de seus interesses geopolíticos e econômicos.


Essas ditaduras foram financiadas, armadas, treinadas e apoiadas politicamente por estadunidenses e europeus por décadas para fazer frente à "ameaça comunista" e ao "terrorismo", bem como para assegurar o livre acesso de suas poderosas corporações econômicas às riquezas naturais daqueles países, em particular ao petróleo. Nunca é demais lembrar a grande proximidade de Kadafi com os italianos - e suas empresas petrolíferas -, de Bin Laden e de Hosni Mubarak com os Estados Unidos, apenas para citar alguns exemplos.

A incerteza é a principal certeza que temos no momento. Ou seja, ninguém sabe ao certo se os levantes populares resultarão realmente em sociedades democráticas e em países soberanos, ou se estes apenas mudarão de feitores. Isto porque a repressão desencadeada contras as populações pelos "novos" regimes continua sendo a tônica para debelar os enormes conflitos existentes.

Por outro lado, na Europa, crescem vertiginosamente os grupos extremistas de direita. Recentemente a chanceler alemã afirmou que a tentativa de uma "sociedade multicultural" fracassou. O que realmente ela quis dizer com isso? É uma regressão às teses da "raça ariana"? Na Holanda, Áustria, França, Itália, Inglaterra, Espanha, Alemanha e outros países dominados por governos conservadores se expandem movimentos xenófobos concomitantemente ao endurecimento de políticas anti-imigrantes. Recentemente o governo inglês expulsou ciganos de uma área e ateou fogo no acampamento.

As rebeliões pelas ruas de diversas cidades na Inglaterra se iniciaram por conta da morte de mais um jovem negro pela polícia. Esses jovens são comumente parados nas ruas, molestados e humilhados por policiais. São pobres, filhos de imigrantes e vivem nas periferias. A repressão contra eles foi violenta. A polícia chegou a prender as mães de alguns dos "revoltosos" como se tivessem alguma culpa pelos atos dos filhos. Crianças também foram presas. A grande imprensa, o governo, os endinheirados e a maior parte dos políticos ficaram "horrorizados", defenderam prisões e condenações sumárias aos "terroristas" e a censura aos blogs, exigiram ter acesso ao conteúdos das mensagens trocadas pelos internautas nas redes sociais, tal qual foi executado pelos regimes autoritários árabes, num claro atentado às liberdades individuais.


Nos Estados Unidos ganha força o movimento Ocupa Wall Street que luta contra o poder avassalador do sistema financeiro, grande responsável pela mais grave crise econômica estadunidense desde a II Guerra Mundial. Naquele país a política foi capturada pelo capital financeiro. É ele quem dá as cartas: elege parlamentares e governos, determina a política econômica e se apossa da maior fatia da riqueza nacional. O número de pobres e desempegados é imenso e, na melhor das hipóteses, não piorará nos próximos anos. A educação nos EUA atende predominantemente os ricos. Quem é pobre jamais terá acesso às universidades de ponta, estas profundamente vinculadas às grandes empresas, assim como não tem acesso a um sistema de saúde estruturado para atendê-lo. Faltam professores de Matemática, Física, Biologia e outras disciplinas básicas em grande parte das escolas públicas dos EUA. Isto porque não há interesse dos jovens pelo magistério. Enquanto isso o fosso entre ricos e pobres aumenta a cada ano, como bem demonstram as pesquisas mais recentes. E qual a resposta governamental? Prisões e agressões aos manifestantes. Se você quiser ter uma visão do domínio do capital financeiro sobre a vida estadunidense assista o filme Inside Job.


No Chile, jovens estudantes se rebelam contra o governo exigindo maiores investimentos na educação pública. O ensino foi privatizado com a ascensão do ditador Pinochet ao poder e essa situação se manteve durante os "governos democráticos". Mais repressão, prisões e processos na Justiça contra os manifestantes. Um jovem estudante morreu vítima da bala assassina da polícia.

Na Bolívia, indígenas marcharam centenas de quilômetros até a capital La Paz para protestar contra a construção de uma rodovia que atravessaria o Território Indígena Parque Nacional Isiboro Sécure (TIPNIS). Empreendimento financiado pelo Brasil através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES), e cuja construção estaria a cargo de uma grande empreiteira brasileira. A repressão contra os indígenas foi violenta: tiros, prisões, crianças separadas de seus pais e uma pessoa assassinada pelas forças policiais. Repressão esta cometida por um governo que possui um indígena no seu comando, Evo Morales.


No Brasil, o governo federal ignora as denúncias da sociedade civil sobre as diversas ilegalidades cometidas pelo Estado brasileiro para garantir a construção de Belo Monte. Contudo, já é possível constatar os impactos negativos dessa obra: crescimento expressivo da violência contra mulheres e crianças, centenas de famílias sem teto por não terem onde morar devido o abusivo aumento do preço dos aluguéis, carestia, assaltos, assassinatos etc. Tudo em nome do "progresso" e do "desenvolvimento" (para quem?).

Apesar de tudo o que citamos acima há quem ainda se indigna e vai à luta. Esse é o aspecto positivo da coisa. O que nos faz acreditar firmemente que tudo ainda pode ser mudado.